Sindicalismo

Douglas Izzo: “Abertura do comércio em São Paulo põe em risco a vida da população”

Presidente da CUT São Paulo fala sobre postura dos governos e a atuação do movimento sindical durante a pandemia

Maria Dias/CUT-SP

Vanessa Ramos, da CUT São Paulo

  Maria Dias/CUT-SP

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Os números de infectados e mortos pela Covid-19 não param de crescer. Nesta quinta-feira (11), o estado de São Paulo chegou a 162.520 pessoas infectadas e 10.145 mortos pela doença causada pelo novo coronavírus.
Mesmo diante deste cenário, o governador paulista, João Doria (PSDB), e o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB) permitiram, a partir desta semana, a abertura de comércios e serviços. Enquanto isso, os trabalhadores seguem reféns das decisões do Executivo, enquanto o movimento sindical se reúne com políticos e faz pressão junto aos empregadores para garantir direitos, equipamentos de proteção e o isolamento social.  
Sobre essas questões, entrevistamos o presidente da CUT São Paulo, Douglas Izzo. Confira a íntegra desta conversa a seguir.
CUT São Paulo: Quais as principais ações da CUT São Paulo e seus sindicatos neste momento de pandemia do coronavírus para preservar a vida dos trabalhadores e assegurar empregos, renda e direitos?
Douglas Izzo: Ao lado de sindicatos e ramos CUTistas, nossa central não tem hesitado na defesa dos direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras nesse período de pandemia. Acompanhamos a atuação das diversas categorias e regiões do estado, que já resultou em conquistas importantes junto aos empregadores ou às entidades patronais. Mas sabemos que ainda há muita luta sendo travada para garantir as condições necessárias de proteção para quem atua nos setores essenciais, como é o caso dos profissionais da saúde na capital e em várias cidades, do pessoal dos transportes entre outros. São lutas que contam com apoio incondicional da CUT São Paulo e que reforçam nosso posicionamento em defesa da vida.
Como a CUT avalia a atuação do governo federal?
Estamos diante de um governo irresponsável. Temos atuado firmemente para reverter os efeitos das medidas provisórias do governo Bolsonaro, que se aproveita da crise para aprofundar os ataques aos direitos. Acima de tudo, lutamos para garantir que os trabalhadores tenham assegurado 100% de sua renda e seus empregos. Mais do que nunca, defendemos que o governo, ao invés de tirar dos trabalhadores, busque por novas receitas, como por exemplo, fazendo a taxação do lucro dos bancos, das grandes fortunas, proibindo a remessa de lucros para o exterior, enfim, cobrando de quem tem condições não só de contribuir com o combate à crise, mas também com a recuperação da economia quando superarmos esse momento.
Como tem sido a construção dessas pautas junto aos movimentos populares?
Muitos posicionamentos são comuns entre a CUT e demais centrais, bem como com as frentes Brasil Popular e Povo sem Medo. Inclusive, uma campanha de apoio à taxação das grandes fortunas foi lançada recentemente pelos movimentos, com nosso total apoio. Assim como no passado lutamos pela revogação da Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos públicos por 20 anos em áreas essenciais, como é o caso da saúde, que teve 20 bilhões a menos de investimento, setor tão importante que precisa de mais recursos para as ações de combate ao coronavírus neste momento. Nossos sindicatos também estão empenhados em promover ou apoiar ações de solidariedade a quem mais precisa, com arrecadação de alimentos não perecíveis, produtos de limpeza e higiene, e ainda disponibilizando suas estruturas para o poder público criar espaços de atendimento à população.
Como avalia a atuação do governo de João Doria (PSDB) em São Paulo no combate ao coronavírus e à preservação de direitos?
O que notamos desde o início da pandemia é que Doria tem feito disputas política com Bolsonaro, de olho nas eleições de 2022. Se por um lado, as medidas de contenção do governo paulista valorizaram a importância do isolamento e distanciamento social, mesmo sob ataque de grupos bolsonaristas, por outro, o governo deixou a desejar quanto a ações voltadas à proteção social e, principalmente, aos servidores públicos estaduais das áreas de saúde e segurança pública. Pior ainda é que Doria e Bruno Covas (prefeito da cidade de São Paulo) permitem, neste momento em que ultrapassamos 40 mil mortes por coronavírus no país, a reabertura dos comércios e serviços em São Paulo. Vimos (no dia 10 de junho – data da reabertura) aglomerações em ruas e lojas e comércios fechando muito depois das 15h, uma total irresponsabilidade. Isso põe em risco a vida da população.
Entendemos que diante do quadro da cidade de São Paulo e da grande São Paulo, o governo deveria manter as medidas de quarentena e não fazer flexibilização neste momento, pois isso poderá acarretar no aumento da contaminação e até no colapso do sistema de saúde no estado. Neste caso, os governos municipais, estadual e federal deveriam construir as condições para as pessoas ficarem em casa.
Diante disso, quais os principais problemas enfrentados pelos servidores públicos?
Desde o início, os servidores paulistas sofrem com a falta de equipamentos de proteção individual (EPI’s) para o desempenho de suas funções. Essa questão dos EPIs é fundamental, pois o Estado tem de garantir a proteção dos servidores para que possam seguir atendendo a população. Além disso, é urgente a ampliação da capacidade de realização de testes para Covid-19. Os números apresentados até o momento mostram que o índice de testagem no Brasil não é o ideal, pois a estimativa de subnotificação ainda é alta.
Qual atuação da CUT para resolver estas questões?
Realizamos duas reuniões junto ao governo de São Paulo. Levamos tanto para o vice-governador como para o governador as demandas dos trabalhadores, inclusive com relação à falta de diálogo com as categorias dos servidores. Nas duas oportunidades, ambos se comprometeram em abrir canal de diálogo com os sindicatos que representam os trabalhadores. Primeiro com o pessoal da saúde e, mais recentemente, com metroviários, ferroviários e servidores da educação. Nessa última reunião com o governador, no final de maio, que discutiu os protocolos de saúde e higiene no trabalho do Plano São Paulo, que prevê a retomada das atividades, cobramos que questões discutidas anteriormente com representantes das centrais sindicais e do governo estadual, que não foram incluídas no documento divulgado, fossem incorporadas ao Plano, como a participação das centrais nos comitês de crise; o canal de denúncias para punir empregadores que não cumprirem os protocolos, além de deixar mais explícitos os critérios para a realização de teste para coronavírus nos trabalhadores e a obrigatoriedade do cumprimento dos protocolos. Saímos com um encaminhamento significativo que foi a criação de um espaço tripartite para avaliação do programa e discussão da retomada da economia. Também defendemos a necessidade de rediscutir a industrialização no estado e reforçamos nossa posição em defesa das medidas voltadas à preservação das vidas no país.
O que os trabalhadores e a população devem fazer nesta conjuntura de pandemia?
Precisamos de unidade entre o movimento sindical, movimentos sociais, estudantes e o conjunto da classe trabalhadora e da população para enfrentarmos, além dos desafios que a situação nos impõe, os ataques do governo Bolsonaro que insiste em fazer disputa política com os governadores de praticamente todos os Estados, defendendo o isolamento vertical e a volta ao trabalho em todos os setores, colocando medo nas pessoas de que se não forem trabalhar não terão mais empregos, repetindo que a economia não poder parar, mesmo sabendo que o país não possui estrutura no sistema de saúde público e privado para atender a possível demanda que pode surgir com o aumento dos casos de infecção pelo vírus. Por isso, não podemos deixar de destacar a importância do nosso Sistema Único de Saúde (SUS), no combate ao coronavírus que precisa cada vez mais do nosso apoio na luta em sua defesa. Também é preciso destacar o papel fundamental dos trabalhadores e trabalhadoras da saúde entre outros considerados serviços essenciais que estão na linha de frente para garantir atendimento à população.
Quais reflexões o movimento sindical tem feito para o momento pós-pandemia?
Temos o desafio de nos prepararmos para o fim da pandemia, que antecipou mudanças significativas no modo de trabalho e nos meios de produção. A unidade dos setores progressistas nessa luta em defesa da vida, da democracia e no debate sobre a relação com a sociedade para garantir que o ônus dessa crise sanitária não recaia sobre os trabalhadores e a população será fundamental. Precisamos ainda refletir conjuntamente sobre a sociedade que queremos, e nessa sociedade qual é o papel do Estado. É um Estado mínimo como defende Bolsonaro e seu ministro Paulo Guedes ou se é um Estado indutor, que produz política pública, distribui renda e fomenta políticas sociais para equalizar os problemas da sociedade?

Escrito por: Vanessa Ramos – CUT São Paulo