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Saiu na imprensa: Para privatizar Eletrobras, ‘golden share’ volta

Retorno de ação especial e novo fundo na região Norte são apostas para avançar em capitalização

Fabio Graner e Daniel Rittner — Valor Econômico / De Brasília

Na tentativa de tirar da inércia a privatização da Eletrobras, o governo negocia ao menos duas mudanças no projeto de lei já enviado ao Congresso Nacional: o ressurgimento de uma “golden share” (ação de classe especial que dá alguns direitos de veto ao governo) e a criação de um fundo destinado especificamente para investimentos na região Norte.
Sem alarde, esse movimento está sendo costurado pela equipe do presidente Jair Bolsonaro com parlamentares. É uma estratégia para desengavetar a capitalização da gigante do setor elétrico, que tramita sem avanços na Câmara dos Deputados e nem sequer tem um relator designado. A venda da estatal é uma das grandes prioridades na agenda de privatização e redução do Estado pelo governo e ganhou ainda mais relevância na estratégia pós-pandemia.
A proposta original do governo Michel Temer era privatizar a Eletrobras, mas mantendo uma ação de classe especial nas mãos da União. Ela daria ao governo poderio para interferir em decisões estratégicas dos futuros acionistas majoritários, como mudança da sede, do nome ou da marca da empresa. Em ano de eleições, mesmo contando com esse dispositivo, o projeto de Temer não foi adiante.
Na gestão Bolsonaro, depois de longas discussões, uma nova proposta foi enviada sem a “golden share”, que não contava com grande simpatia na equipe econômica. Diante da resistência de deputados e senadores, a possibilidade agora é reavaliada pelo governo para mover as “placas tectônicas” do Congresso e destravar a privatização, que nunca encontrou um ambiente favorável na Casa. Nos bastidores, avalia-se que apenas com alterações significativas no texto seria possível aprová-lo.
A ideia de retomar a “golden share” surgiu em conversas de senadores com os ministérios da Economia e de Minas e Energia. Ainda há no governo quem não goste do mecanismo, avaliando que na prática isso pode reduzir o valor da empresa, dado que tiraria poder dos acionistas privados e que o instrumento estaria defasado no tempo, com a União Europeia, por exemplo, discutindo não permitir mais esse desenho.
Porém, uma vez que a prioridade é vender a companhia, para lhe dar maior capacidade de investimento e reforçar a situação fiscal do governo, a visão é que, se isso for um dos fatores a viabilizar a aprovação da matéria, o governo apoiará sua inclusão.
Outra ideia estudada entre parlamentares e governo é repetir, na região Norte, o fundo de revitalização do rio São Francisco que beneficiará o Nordeste. Com valores diferentes, tanto Temer quanto Bolsonaro haviam proposto a criação de um fundo com parte da outorga a ser paga pela própria Eletrobras – já capitalizada com recursos privados – na renovação das concessões de suas usinas hidrelétricas por 30 anos.
O fundo para a região Norte, a princípio, talvez não seja destinado necessariamente a ações socioambientais. No cálculo político do Palácio do Planalto, isso poderia dobrar a resistência de parlamentares da bancada amazônica e angariar votos importantes.
O governo descarta, porém, mexer no essencial do modelo: uma chamada de capital em que a União não acompanhará os aportes de acionistas privados e, com isso, diluirá sua participação na Eletrobras – o que leva à perda de controle. Em seguida, já capitalizada, a companhia pagará pela renovação das suas concessões.
Como compensação, poderá vender a energia produzida pelas hidrelétricas a preços de mercado e não mais pelo regime de cotas. É o que se tem chamado, no mercado, de “descotização” das usinas.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), já afirmou que o projeto teria maioria contrária na Casa. Maia, por sua vez, ainda não deliberou o encaminhamento do projeto. Não se sabe, por exemplo, se tramitará por comissões setoriais ou será avaliado por uma comissão especial – o que normalmente encurta o caminho até sua votação em plenário.
Pesquisas contratadas pela Eletrobras ainda no governo Temer apontavam que o apoio de deputados e senadores à privatização aumenta substancialmente quando se inclui a hipótese de um dispositivo como a “golden share”.
Por Fabio Graner e Daniel Rittner — Valor Econômico / De Brasília