Assinado no dia 1º de outubro pelo presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL), o decreto 10.502/2020, que trata da Política Nacional de Educação Especial (PNEE), vai contra qualquer iniciativa de inclusão e promoção dos direitos ao permitir que instituições de ensino separem estudantes com deficiência dos demais.
Pesquisa do Censo Escolar, divulgada no início deste ano, mostra que o Ministério da Educação (MEC) registrou aumento de 5,9% nas matrículas de alunos com deficiência em 2019, mantendo a tendência de crescimento que ocorre desde 2014. Oficialmente são 1,3 milhão de estudantes com deficiência matriculados no ensino regular.
O texto da nova PNEE, além de não dialogar com nenhuma norma específica de educação, fere a Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (que tem força de lei no Brasil pelo Decreto Legislativo 186, de 2018, e pelo Decreto 6.949, de 2009). Também vai contra a Lei Brasileira de Inclusão (Lei 13.146, de 2018).
“Foram anos de luta para conquistar espaço e o mínimo de dignidade e equidade nas escolas. Agora vem este desgoverno querendo isolar os estudantes com deficiência em um espaço onde eles têm que lidar somente com pessoas ‘iguais’, sendo que o correto é que esses educandos possam conviver com outras crianças, pois é científica e pedagogicamente comprovado que elas interagem e evoluem por meio da vivência das experiências com o meio, ou seja, com outras crianças”, explica José Roberto Santana da Silva, coordenador do Coletivo Nacional de Trabalhadores e Trabalhadoras com Deficiência da CUT.
Diversas entidades, sindicatos e políticos que atuam na luta das pessoas com deficiência são contrários ao decreto. Muitos citam que o objetivo do governo é atender a interesses privatistas de instituições que atuam no segmento e estão de olho nos recursos da educação, que tiveram aumento neste ano após pressão da sociedade. No Senado, o parlamentar Fabiano Contarato (Rede-ES) apresentou um projeto para suspender os efeitos do decreto e se movimenta para ganhar apoio na Casa.
Secretária de Políticas Sociais da CUT-SP, Kelly Domingos chama de hipocrisia a atitude do governo.“Do que adianta o Bolsonaro e a primeira-dama, Michelle, fazerem discursos defendendo as pessoas com deficiência nas redes sociais, mas, na prática, usarem a estrutura de governo e a caneta para excluir essa população? Mais uma vez estamos diante de um imenso e vergonhoso retrocesso promovido por hipócritas”.
Em nota, a CNTE-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) diz que a nova PNEE é uma grave ofensa do governo. “Essa orientação retrógrada da PNEE-2020 colide com os objetivos construídos pela sociedade brasileira, inclusive à luz de orientações internacionais, que privilegiam as políticas de ampla inserção das pessoas com deficiência nas escolas e demais setores da vida pública. E, ao invés de investir na ampliação desses compromissos reivindicados pela sociedade, o governo Bolsonaro se volta para um tipo de atendimento escolar segregador e orientado para a oferta predominante privada”.
José Roberto lembra que a pessoa com deficiência deve estar aonde ela quiser, conforme garante a Constituição. “Pessoas com deficiência são cidadãos brasileiros e têm os mesmos direitos que qualquer um. Não nos cabe ter que se adaptar aos locais, por isso precisamos de políticas públicas que obriguem os espaços a terem estruturas para atender qualquer pessoa, garantindo o direito de ir e vir”, conclui.
Escrito por: Rafael Silva – CUT São Paulo