IMPACTOS DA PANDEMIA

“Vivemos uma verdadeira guerra, contra o vírus, contra as aglomerações, contra o negacionismo”, alerta a médica Maria Maeno, especialista em Saúde Pública

Médica foi uma das participantes da mesa “Pandemia e os impactos na saúde e na vida dos trabalhadores”, ao lado do sindicalista Loricardo de Oliveira, abrindo o segundo dia de debates virtuais da Reunião da Direção Colegiada do Sinergia CUT, na manhã do último sábado

Roberto Claro

Lílian Parise

Médica foi uma das participantes da mesa “Pandemia e os impactos na saúde e na vida dos trabalhadores”, ao lado do sindicalista Loricardo de Oliveira, abrindo o segundo dia de debates virtuais da Reunião da Direção Colegiada do Sinergia CUT, na manhã do último sábado

Na semana em que o Brasil atingiu o recorde mundial de mais de 351 mil mortes pela covid-19, com média de quase três mil vidas perdidas diariamente, o Sinergia CUT abriu o segundo dia da 3ª Reunião da Direção Colegiada, na manhã do último sábado (10), para debater o tema “Pandemia e impactos na saúde e na vida dos trabalhadores e trabalhadoras”.

Dois convidados participaram da mesa virtual, com mediação de Rafael Magalhães, secretário geral do Sinergia Gasista: Maria Maeno, médica especialista em Saúde Pública e pesquisadora na área de Saúde do Trabalhador, e Loricardo de Oliveira, secretário geral da CNM (Confederação Nacional dos Metalúrgicos) e representante da CUT na CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente).

“Estamos vivendo o momento mais grave da pandemia, com o Brasil em colapso, já registrando março e abril como os piores meses, com milhares de mortes e de contágios, calamidade que é resultado principalmente do negacionismo do governo federal”, destacou Maria Maeno. “Vivemos uma verdadeira guerra, contra o vírus, contra as aglomerações, contra o negacionismo”, alertou.

“Política intencional de boicote ao SUS”

Para ela, essa realidade de calamidade pública e de sistema de saúde colapsado começou a ser desenhada desde o início da pandemia, só reconhecida em março do ano passado. “Desde o começo, convivemos com os obstáculos impostos pelo governo federal no combate ao contágio do novo coronavírus. A falta de articulação entre os governos federal e estaduais para garantir um plano integrado de saúde e de recursos públicos, nenhuma campanha de prevenção, intensa propagação do tratamento precoce sem nenhuma comprovação científica, nenhum controle sobre as viagens internacionais que espalharam o vírus e o contágio, uma política intencional de boicote ao SUS, que é referência mundial de vacinação em massa”, argumentou a médica.

Maeno também apontou que políticas públicas de saúde poderiam ter amenizado os tratamentos e as mortes por covid-19.  “Os médicos de família, junto com profissionais de saúde, que criam vínculos de confiança com pacientes, poderiam repassar informações e orientações importantes. Essa assistência integrada, com tratamento, reabilitação e atenção domiciliar, fortalecendo e investindo no SUS como um todo, certamente evitariam o colapso atual”, afirmou.

“Sozinha, vacina não é milagrosa”

Sobre a chegada das vacinas, considerada uma esperança, a médica afirmou que é um avanço, mas, sozinha, não é milagrosa. “Não há imunidade coletiva diante das novas variantes e dos poucos vacinados, já que as aglomerações continuam. O Brasil é preparado para a vacinação em massa, o SUS tem capacidade de vacinar até dois milhões de pessoas por dia, mas não temos vacina. Promover a testagem em massa, estimular o isolamento social, restringir o contágio através de lockdown e investir em políticas públicas de prevenção e de saúde integrada são iniciativas para ontem. São as únicas formas que ainda temos para superar o colapso atual, preservar vidas e combater a pandemia”, disse Maeno.

Médica Maria Maeno, especialista em Saúde Pública e pesquisadora na área de Saúde do Trabalhador. Foto: Roberto Claro

Preocupada com as condições de trabalho de várias categorias essenciais que continuam atuando na linha de frente – como eletricitários, gasistas, jornalistas, professores, condutores, entre outros profissionais – a médica foi cirúrgica. “É fato que o vírus circula nos locais de trabalho, muitos sem ventilação ou garantia de isolamento, no transporte coletivo diário e em situações de risco de atividades essenciais, vale tudo para favorecer o capital”, pontuou.

“É preciso garantir direitos já”

E continuou: “Por isso, é preciso garantir direitos já, com recursos para os infectados e os doentes, como auxílio doença, Fundo de Garantia, auxílio acidente para amenizar sequelas, pensão por morte. Como prevenção, além do lockdown para assegurar o isolamento social, é urgente o auxílio emergencial de R$ 600, melhores condições para quem precisa do transporte coletivo, manutenção de emprego e renda para todos, atenção especial aos que têm comorbidades, além de vacina para todos. Enfim, é urgente garantir a igualdade de condições para todos, principalmente para os que mais precisam e que estão sendo mais afetados pelo desemprego e pela fome”.

Como médica comprometida com a saúde pública, estudiosa da relação entre a covid-19 e as diversas atividades profissionais exercidas presencialmente na pandemia, Maria Maeno participa de pesquisa e estudo do projeto “Covid-19 como uma doença relacionada ao trabalho”, promovida pela Associação de Saúde Ambiental e Sustentabilidade (ASAS). O projeto inclui a realização de uma pesquisa com trabalhadores formais e informais de vários segmentos, que vai analisar e dar visibilidade às condições de trabalho enfrentadas na pandemia.

“Bolsonaro rompeu acordo na CTPP, mas teve que recuar”

O dirigente metalúrgico Loricardo de Oliveira, representante da CUT na CTPP (Comissão Tripartite Paritária Permanente) foi o segundo palestrante da manhã de sábado (10) e também abordou as dificuldades enfrentadas durante o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) que, assim que assumiu a presidência, assinou decreto que pretendia acabar com a comissão. “Rompeu um acordo de anos, mas, por reação da CUT e outras centrais, foi obrigado a recriar o fórum que debate principalmente as Normas Regulamentadoras sobre a saúde dos trabalhadores, com a participação das centrais sindicais, empresas e governo”.

Loricardo de Oliveira, metalúrgico e representante da CUT na CTPP. Foto: Alencar Roberto

Com a chegada da pandemia, Oliveira afirmou que foram inúmeras as divergências nos debates sobre as NRs. “Estamos discutindo em separado, por exemplo, a NR 17, que trata da ergonomia e dos riscos psicossociais dos trabalhadores, e a NR 32, que aborda o trabalho agrícola. Além dos ataques do governo federal, os representantes do patronal também querem tirar direitos, como a não emissão da CAT, mudanças no formato das CIPAs e regramento dos trabalhadores de telemarketing, um dos símbolos de local de trabalho doente”, denunciou.

Sobre a NR 10, que trata da necessidade do trabalho em dupla para eletricitários, diante da possibilidade de socorro recíproco em caso de emergência, o sindicalista afirmou que governo e patronato também querem mudanças. “Estão querendo acabar com a exigência do trabalho em dupla, considerando que só um trabalhador basta, mas o interesse real é o de extinguir o adicional de periculosidade, o que é inadmissível”, afirmou.

Para Oliveira, o momento atual é de muita dificuldade para debates entre trabalhadores, patrões e governo. “Enfrentamos atualmente dificuldade em pautar assuntos de interesse da classe trabalhadora. É o governo de Bolsonaro que está pautando tudo, o que exige de nós, trabalhadores, muita mobilização. O governo tem pressa para desregulamentar tudo. Nós, CUT e sindicatos, vamos continuar com tranquilidade para garantir direitos conquistados e avançar com muita formação e organização sindical”, finalizou. 

 Por Lílian Parise