Depois de 15 anos da Lei Maria da Penha, pandemia faz aumentar também violências contra mulheres e crimes de feminicídio

Às vésperas do aniversário de 15 anos da Lei Maria da Penha, mulheres convivem com outros aumentos pandêmicos: a violência doméstica no isolamento e os casos de feminicídio. Não se cale! Denuncie!

Lílian Parise

Às vésperas do aniversário de 15 anos da Lei Maria da Penha, mulheres convivem com outros aumentos pandêmicos: a violência doméstica no isolamento e os casos de feminicídio. Não se cale! Denuncie!

Mais de um ano e meio depois, e ainda sobrevivendo diante da maior pandemia sem controle no Brasil, que já registra mais de 550 mil mortes provocadas pela covid-19, as mulheres brasileiras vêm convivendo também com outros aumentos pandêmicos: o da violência doméstica durante o isolamento e o de feminicídios cometidos por atuais ou ex-companheiros.

Tudo isso às vésperas do aniversário de quinze anos da Lei Maria da Penha, sancionada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 7 de agosto de 2006, depois de muita luta e da condenação do Brasil pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Em 2001, a Corte apontou negligência e omissão do país em relação à violência doméstica, resultado do caso da farmacêutica cearense, que ficou paraplégica em uma tentativa de feminicídio do marido e que foi obrigada a passar por uma batalha judicial sofrida para responsabilizar seu agressor.

Mas, mesmo o Brasil sendo signatário de tratados internacionais que se comprometem a erradicar a violência contra as mulheres, e reconhecido por ter uma das legislações de gênero mais sofisticadas do mundo, também continua sendo um país conhecido por violar, neglicenciar, relativizar e questionar as mulheres vítimas, conforme alertam inclusive especialistas no tema.

NÃO SE CALE! DENUNCIE!

Verdade também é que a pauta de relacionamentos tóxicos – com várias campanhas de combate à violência física, psicológica ou patrimonial que foram intensificadas – atualmente ocupa manchetes para divulgar essas campanhas de apoio e de acolhimento em todos os meios de comunicação diariamente.

Mas, no dia a dia, não dá para negar também que a grande maioria das vítimas continua invisível, já que nem todas têm condições dignas de moradia e acesso à internet ou até mesmo por medo de represálias e das ameaças para enfrentar a batalha judicial, muitas vezes demorada e tardia até para a garantia de medida protetiva.

É sempre bom lembrar que a Lei Maria da Penha prevê que é obrigação de todos e todas – do Ministério Público, da Defensoria, do Judiciário, das polícias, da sociedade e de cada pessoa individualmente – a missão de punir e erradicar todas as formas de violência, especialmente a doméstica.

Ainda assim, o Brasil atual segue virando as costas às mulheres, principalmente agora com um governo que legitima e praticamente incentiva a violência contra a mulher, dando a entender que as vítimas são loucas e indignas de confiança. Para piorar, também não investe em políticas públicas para mulheres, nem em programas para a população feminina ou de proteção às vítimas de violência.

Diante da gravidade da situação, o Coletivo de Mulheres continua na luta para reforçar que violência contra mulheres é crime e deve ser denunciado sempre. Ligue para o 180, canal de atendimento criado especialmente para lidar com casos de violência doméstica e que, além de receber denúncias, também pode ser utilizado para a solicitação de informações sobre delegacias próximas e redes de acolhimento.

UM RESUMO DA LEI MARIA DA PENHA *

A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com 46 artigos distribuídos em sete títulos, ela cria mecanismos para prevenir e coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher em conformidade com a Constituição Federal (art. 226, § 8°) e os tratados internacionais ratificados pelo Estado brasileiro (Convenção de Belém do Pará, Pacto de San José da Costa Rica, Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem e Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher).

  • O Título I determina em quatro artigos a quem a lei é direcionada, ressaltando ainda a responsabilidade da família, da sociedade e do poder público para que todas as mulheres possam ter o exercício pleno dos seus direitos.
  • Já o Título II vem dividido em dois capítulos e três artigos: além de configurar os espaços em que as agressões são qualificadas como violência doméstica, traz as definições de todas as suas formas (física, psicológica, sexual, patrimonial e moral).
  • Quanto ao Título III, composto de três capítulos e sete artigos, tem-se a questão da assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar, com destaque para as medidas integradas de prevenção, atendimento pela autoridade policial e assistência social às vítimas.
  • O Título IV, por sua vez, possui quatro capítulos e 17 artigos, tratando dos procedimentos processuais, assistência judiciária, atuação do Ministério Público e, em quatro seções (Capítulo II), se dedica às medidas protetivas de urgência, que estão entre as disposições mais inovadoras da Lei n. 11.340/2006.
  • No Título V e seus quatro artigos, está prevista a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, podendo estes contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar composta de profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e da saúde, incluindo-se também destinação de verba orçamentária ao Judiciário para a criação e manutenção dessa equipe.
  • O Título VI prevê, em seu único artigo e parágrafo único, uma regra de transição, segundo a qual as varas criminais têm legitimidade para conhecer e julgar as causas referentes à violência de gênero enquanto os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher não estiverem estruturados.
  • Por fim, encontram-se no Título VII as disposições finais. São 13 artigos que determinam que a instituição dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher pode ser integrada a outros equipamentos em âmbito nacional, estadual e municipal, tais como casas-abrigo, delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde, centros de educação e reabilitação para os agressores etc. Dispõem ainda sobre a inclusão de estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema de Justiça e Segurança, além de contemplarem uma previsão orçamentária para o cumprimento das medidas estabelecidas na lei. Um dos ganhos significativos trazidos pela lei, conforme consta no art. 41, é a não aplicação da Lei n. 9.099/1995, ou seja, a violência doméstica praticada contra a mulher deixa de ser considerada como de menor potencial ofensivo.

*Fonte: Instituto Maria da Penha

Por Lílian Parise