Desprezo à ciência

Governo gastará R$ 145 milhões em satélite que fará mesmo trabalho do Inpe

Enquanto os governos federal e estadual cortam verbas e anunciam o fechamento de institutos de pesquisa, gastos milionários de dinheiro público são feitos via iniciativa privada em projetos semelhantes aos desses institutos

Satélite CBERS 04A após o ultimo teste de simulação espacial no INPE

Comunicação do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa, Ciência e Teconologia - SINTPq

Enquanto os governos federal e estadual cortam verbas e anunciam o fechamento de institutos de pesquisa, gastos milionários de dinheiro público são feitos via iniciativa privada em projetos semelhantes aos desses institutos. Um exemplo recente veio a público nesta semana, em reportagem d’O Globo. Segundo a publicação, o Ministério da Defesa empenhou mais de R$ 145,3 milhões na compra de um microssatélite que fará o monitoramento da devastação da floresta amazônica. 
O que o governo parece ignorar é o fato dessa fiscalização já ser exercida pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Esse trabalho é feito há décadas, com tecnologia tão ou mais desenvolvida, e com condições técnicas adequadas, uma vez que as forças armadas não dispõem da capacitação necessária para a variedade de análises e aplicações feitas pelo Inpe. Este constitui mais um indício que as aplicações pretendidaspelas Forças Armadas estão voltadas para as áreas militares e de mineração. 
Ainda de acordo com a reportagem, o novo microssatélite tem um custo 48 vezes maior do que a verba prevista no orçamento deste ano (R$ 3,03 milhões) para projetos de monitoramento da terra e de risco de incêndios. O conjunto abrange o Prodes e o Deter, que emitem boletins sobre o desmatamento da Amazônia, e o Programa Queimadas, responsável por detectar focos de calor em todo o país. 
Segundo a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2020, o Inpe recebeu R$ 118,2 milhões. Já para 2021, o projeto de LOA prevê R$ 79,7 milhões de orçamento para o instituto. Esses números mostram que a manutenção do Inpe é mais barata e eficiente do que a compra de um satélite para fins militares. 
O Jornal do SindCT (Sindicato dos Servidores Públicos Federais na Área de Ciência e Tecnologia do Setor Aeroespacial) também repercutiu a compra do microssatélite. Confira abaixo um trecho da reportagem.  
Os microssatélites
Diferente dos três satélites internacionais utilizados pelos sistemas de monitoramento do Inpe, o Ministério da Defesa pretende comprar um microssatélite.
O pesquisador do instituto de pesquisa sobre a Amazônia Imazon, Carlos Souza Junior, explica que a tecnologia utilizada em microssatélites consegue, de fato, gerar dados refinados sobre a área monitorada. Porém, para isso, é preciso ter vários microssatélites atuando em conjunto.
“Este tipo de satélite foi desenvolvido para ser lançado em dezenas, centenas em uma mesma área, formando uma constelação de satélites que consegue captar um nível de resolução mais fina da imagem monitorada”, explica Souza.
Souza lembra que, além dos sistemas de monitoramento do Inpe, o Imazon também monitora e calcula as áreas em desmatamento nas florestas do país. O Imazon já utiliza, inclusive, imagens de microssatélites.
“Por meio do projeto Map Biomas Alerta, utilizamos imagens de todos os biomas de uma constelação de microssatélites comerciais. Temos dados refinados por biomas e regiões. Foi por meio deles, por exemplo, que conseguimos mostrar que 90% do desmatamento no Brasil é ilegal”, explica Souza.
O ambientalista afirma que a tecnologia de microssatélites é válida para monitorar com precisão o desmatamento, mas não basta comprar somente o equipamento, é preciso saber operá-lo.
“Quando você compra um satélite, está comprando o produto apenas. Vai precisar de recursos para operacionalizar a tecnologia, depois vai precisar de uma inteligência computacional, que não é trivial, para dar conta de processar o volume de dados. Senão, vamos ficar atolados em dados”, diz Souza.
Escrito por: Comunicação do Sindicato dos Trabalhadores em Pesquisa, Ciência e Teconologia – SINTPq