A transparência na operacionalização e a execução imediata da devolução ao consumidor de créditos tributários decorrentes de decisões judiciais excluindo o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins foram os assuntos que domiram a audiência pública “Créditos tributários incidentes sobre as tarifas de energia elétrica”. O debate foi realizado nesta terça-feira (28) e promovido pela Comissão de Legislação Participativa (CLP) da Câmara dos Deputados, com transmissão on-line.
Provocado pelo Sinergia CUT, o deputado Alencar Santana Braga (PT-SP) acolheu a sugestão da discussão sobre o tema e recebeu o apoio dos deputados Airton Faleiro (PT-PA) e Reginaldo Lopes (PT-MG) para a realização da audiência. O presidente do Sinergia CUT, Carlos Alberto Alves, que participou do debate, afirmou que é preciso haver transparência e celeridade na devolução, como já solicitou junto à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) por meio de contribuição à consulta pública nº 05/2021.
A transparência se deve, principalmente, ao fato de o valor da devolução dos créditos ser da ordem de R$ 55 bilhões, podendo chegar a R$ 70 bilhões, segundo levantamento da Aneel. Em termos de comparação, o orçamento da Conta de Desenvolvimento Energético para o ano de 2022 do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica na Amazônia Legal – Mais Luz para a Amazônia e do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica – Luz para Todos é de R$ 1,14 bilhão.
A diretora do Departamento de Gestão do Setor Elétrico do Ministério de Minas e Energia, Fabiana Cepeda, informou que, no início deste ano, a pasta formalizou por ofício o Ministério da Economia sobre a importância desses créditos tributários “como alívio para os consumidores brasileiros”. Uma segunda audiência ou consulta pública será realizada ainda este ano, com data a ser divulgada posteriormente, segundo o deputado Alencar Santana, e o Ministério da Economia será convidado a participar.
Além disso, acrescentou que a CLP enviará requerimentos para pedir informações sobre o montante total devido aos consumidores brasileiros e buscará a elaboração de um Projeto de Lei específico sobre a devolução. Ele solicitou à Aneel mais transparência na divulgação de dados.
Cenário atual
A superintendente de Fiscalização Econômica e Financeira da Aneel, Camila Figueiredo Bomfim Lopes, garantiu que a autarquia trabalha “com a premissa que os créditos são direito do consumidor” e que não são de natureza “puramente regulatória”, já que foram determinados por meio de decisão judiciária, necessitam de habilitação junto à Receita Federal e precisam do início da compensação por parte das distribuidoras.
Mas, apesar disso, segundo a superintendente Camila, a Aneel já fez uso, do ano passado até hoje, “provisoriamente, mesmo que tivesse de reverter”, de R$ 6 bilhões relativos aos créditos da Cemig e da EDP Espírito Santo para reduzir o impacto tarifário no reajuste anual dessas duas concessionárias, o que, de acordo com ela, resultou em uma redução de 4,51%. O termo provisório se deve ao fato que a autarquia se antecipou no abate nas contas, já que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) quanto à modulação só foi dada em maio deste ano.
Para o deputado Alencar Santana, muita gente nem ficou sabendo que não estava tendo reajuste ou pagando a menos por conta desses créditos tributários. “Estão fazendo milagre com chapéu alheio”, disse, referindo-se ao fato de que não houve redução de tarifa e sim desconto por valor cobrado a maior do consumidor.
Confira abaixo o raio-X sobre o processo de devolução dos créditos tributários no setor elétrico, de acordo com levantamento da Aneel.
Interesses
Esta devolução é fruto de ações judiciais movidas no passado pelas próprias empresas energéticas, “com interesses no negócio, na sutentabilidade e na modicidade”, como explicou o diretor Jurídico e Institucional da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Wagner Ferreira. Ele detalhou que vários setores da economia, como telecomunicações, saneamento, aviação e rodoviário, entraram com ações contra a Fazenda Nacional para suspender a incidência tributária, podendo alcançar R$ 400 bilhões de devolução.
“A cobrança dos tributos estava na lei, não houve erro de faturamento nas contas dos consumidores”, afirmou Ferreira. “Ela só foi considerada ilegal porque houve ação judicial.” Em 2007, o STF decidiu que a base de cálculo do ICMS sobre o PIS/Pasep (Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público) e da Cofins (Contribuição para Financiamento da Seguridade Social) não poderia ser considerada na conta de energia elétrica. Isso depois de uma enxurradas de ações. Sobre a tarifa, o governo federal recolhe o PIS e a Cofins, e os governos estaduais, o ICMS.
Ferreira acrescentou que ainda há muitas resoluções de consulta e que acabam “gerando insegurança jurídica”, citando como exemplo um parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) emitido no último dia 24. “Uma conta de luz é formada 50% por tributos (40%) e encargos setoriais (10%), ou seja, a cada R$ 100 pagos, R$ 50 são tributos e encargos.”
Consumidores precisam ser ressarcidos
O coordenador do Programa de Energia e Sustentabilidade do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Clauber Leite, discorda da intenção de se “premiar” as empresas de energia elétrica por terem acionado a Justiça, fazendo com que absorvem parte desse valor como espécie de bônus pela iniciativa de terem entrado com as ações judiciais contra a metodologia usada pela Receita Federal. Segundo ele, os custos das empresas estão previstos nas tarifas.
Para o presidente do Sinergia CUT, Carlos Alberto Alves, o disparo do preço da energia, puxando a inflação para cima, não se deve apenas à crise hídrica, mas também à política adotada pelo governo federal. Voltou a lembrar que quem mais sofre é a população mais carente. E finalizou “A energia é fomento de desenvolvimento.”
Assista a audiência
Por Nice Bulhões