Inadmissível

Falar em ‘fuzilar’ a oposição não é liberdade de expressão. É crime

Para advogado, fala do atual presidente “escapa à proteção constitucional e mergulha no campo criminal”. E ameaça o próprio Direito

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Arma Estimuladas pelo presidente, armas apareceram até em evento religioso

Redação RBA

São Paulo – “Não há liberdade (de expressão) para difamar, caluniar ou injuriar, incitar crimes, instigar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou procedência nacional, ou propalar inverdades com o fim de manipular mercados, obter vantagens indevidas ou turbar o processo eleitoral.” Assim, o advogado Pierpaolo Bottini e a advogada Ilana Martins Luz refutam, em artigo, a afirmação de uma professora que “relativizou” a ameaça do presidente da República ao falar, ainda candidato, em “fuzilar a petralhada”. É importante cuidar para que não se pratiquem atos absurdos em nome de direitos consagrados”, defendem.

A origem do texto, no jornal Folha de S.Paulo, está em entrevista dada ao jornal pela professora Clarissa Piterman Gross, da FGV Direito SP. Ela considerou que a frase usada por Jair Bolsonaro “é tosca”, mas estaria protegida pela liberdade de expressão. Uma opinião “equivocada e perigosa”, contestam os autores. Bottini é professor de Direito Constitucional na Universidade de São Paulo (USP) e presidente da Comissão de Liberdade de Expressão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Ilana é doutora em Direito Penal pela USP.

Assim, a fala do atual presidente se inclui nas exceções citadas acima. Porque “escapa à proteção constitucional e mergulha no campo criminal”, acrescentam, citando o artigo 286 do Código Penal: “Incitar, publicamente, a prática de crime”. “Não é preciso que a incitação seja profícua, que algum crime concreto possa ser registrado em sua conta. Basta que as palavras excitem os ânimos de seus destinatários.”

Estratégia estruturada

No caso, a expressão usada por Bolsonaro não foi um “arroubo emocional”, algo isolado. “Trata-se de uma estratégia estruturada. Voltada ao ataque sistemático do partido adversário, à incitação da violência contra opositores, à agressão ao Tribunal Superior Eleitoral, às urnas eletrônicas e qualquer mínima pedra que encontre pelo caminho”, afirmam os advogados.

“A liberdade de expressão admite a exposição de todo pensamento político, até o mais absurdo, desde que pela via pacífica”, acrescentam. Dessa forma, incentivar, por exemplo, a agressão ou ameaçar a integridade dos integrantes dos poderes significa “alargar demais as fronteiras do direito, tornando-o um instrumento para sua própria supressão”. E admitir como liberdade de expressão a recomendação de exterminar o outro “é deixar de demarcar as fronteiras do admissível”.