CPI da Morte

Mandetta depõe na CPI da Covid e comprova: Bolsonaro ignorou todos os alertas

Ex-ministrou apresentou carta, entregue ao presidente em março de 2020, onde defende o isolamento social e "recomenda expressamente" que Bolsonaro que reveja o posicionamento negacionista

JEFFERSON RUDY/AGÊNCIA SENADO

Redação CUT

No primeiro depoimento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado, que apura as ações e omissões do governo de Jair Bolsonaro (ex-PSL) na pandemia do novo coronavírus, nesta terça-feira (4), a CPI da Covid, ou CPI do Genocídio, ouviu do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta pelo menos três relatos e recebeu um documento que prova que o presidente ignorou todos os alertas para conter a transmissão do vírus e evitar milhares de mortes no país.

Nesta quarta-feira (5), a CPI da Covid está ouvindo o depoimento do ex-ministro Nelson Teich, que ficou menos de 30 dias no cargo por discordar das orientações de Bolsonaro.

O depoimento de Mandetta mostrou que Bolsonaro contrariou orientações do Ministério da Saúde baseadas na ciência para o combate à pandemia e adotou discurso negacionista que pode ter contribuído para espalhar mais rapidamente a Covid-19, que já matou mais de 412 mil pessoas no país.

A carta é prova

A prova, que pode ajudar a responsabilizar Bolsonaro pela tragégia, foi a apresentação de uma carta que Mandetta mandou para o presidente em 28 de março do ano passado.

Na carta, cuja cópia foi entregue aos senadores, Mandetta defende o isolamento social e “recomenda expressamente” ao presidente que reveja o posicionamento adotado, acompanhando as recomendações do Ministério da Saúde, “uma vez que a adoção de medidas em sentido contrário poderá gerar colapso do sistema de saúde e gravíssimas consequências à saúde da população”.

Bolsonaro, claro, ignorou todas as recomendações e contiunuou promovendo e estimulando aglomerações, além de não usar máscaras.

Três relatos que contribuem para responsabilizar Bolsonaro pela tragédia:

1 – Imunidade de rebanho

Mandetta disse em seu depoimento na CPI que tem a  “impressão” de que o governo buscava a imunidade de rebanho como estratégia para vencer a pandemia.

Imunidade de rebanho significa que quando um vírus se espalha rapidamente algumas pessoas ficam imunes, pelo menos a curto prazo. E        quem contrai o vírus depois tem contato com essas pessoas imunes e não com as suscetíveis. Ou seja, Bolsonaro acreditava que essa imunidade ocorreria e reduziria o risco de infecção e da doença se espalhar.  

2 – Isolamento social

O ex-ministro Mandetta disse na CPI que Bolsonaro foi alertado que era preciso fazer o isolamento social para conter a transmissão do vírus. Ao invés disso, o presidente vem atacando a medida desde então. Para ele, o isolamento prejudica a economia. Em países como a Nova Zelândia, que decretou lockdown, a economia está reagindo rapidamento enquanto no Brasil, a recessão continua faendo estragos.

3 – Cloroquina

Mandetta também disse no depoimento que não foi o Ministério da Saúde que deu a orientação para o Exército produzir a Cloroquina, medicamento sem eficácia comprovada. Segundo ele, havia quantidade suficiente do medicamento pela Fiocruz para o tratamento da malária para o qual é indicado.

O pedido para alterar a bula do medicamento incluindo entre suas recomendações o uso para tratamento de Covid-19 foi feito em um gabinete no Palácio do Planalto, disse Mandetta, que se recusou a obedecer a orientação.

A polêmica sobre a compra da vacina

O ex-ministro da Saúde lembrou que quando os imunizantes começaram a aparecer, Bolsonaro recusou 11 ofertas da vacina contra a Covid-19. A primeira recusa foi a uma proposta do Instituto Butantan, que produz a CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac, em julho de 2020.

Bolsonaro voltou a recusar outra proposta do Butantan feita em agosto. No mesmo mês, rejeitou oferta da Pfizer, empresa norte-americana que produz a vacina contra Covid-19 desenvolvida pela empresa alemã BioNTech. A proposta da Pfizer previa 70 milhões de doses da vacina.

A questão das vacinas deve se consolidar como um dos principais – se não o maior – problema de Bolsonaro na CPI da Covid, mostra matéria da RBA, que lista mais situações em que o govenro ignorou a importância da vacina para salvar vidas.

Em outubro do ano passado, o chefe do governo garantiu que o Brasil não compraria doses da CoronaVac. “Tudo será esclarecido hoje. Tenha certeza, não compraremos vacina chinesa”, disse o presidente no Twitter, ao desautorizar anúncio do então ministro Eduardo Pazuello, que havia informado a governadores a compra 46 milhões de doses do imunizante.

Pfizer teria vacinado 35 milhões

Na ocasião em que Bolsonaro recusou a CoronaVac, governadores, lideranças políticas e especialistas em saúde se revoltaram com a decisão. “A CPI vai se aprofundar (sobre o tema) por que o Brasil não comprou a vacina da Pfizer”, prometeu o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM). Ele afirmou também que a comissão não vai “acabar em pizza”. “Se a Pfizer tivesse fornecido 70 milhões de vacinas, teríamos vacinado 35 milhões de pessoas.” Nesta quarta (5), a CPI ouve o também ex-ministro da Saúde Nelson Teich. Esperado também amanhã, Eduardo Pazuello, que antecedeu o atual, Marcelo Queiroga, informou que não irá à comissão porque teve contato com contaminados pelo vírus.

Leia mais: CPI da Covid começa com depoimentos de ex-ministros da Saúde e fuga de Pazuello

 “Com todos os procedimentos, máscara, isolamento social, informe publicitário, campanha, o presidente usando máscara, dando exemplo, visitando hospitais, reconhecendo a dor das famílias, teríamos diminuído a escassez de oxigênio, falta de leitos, medicamentos e kits educação para salvar vidas?”, quis saber de Mandetta

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) perguntou a Mandetta se o país não vivenciaria o caos da falta de oxigênio, de leitos e medicamentos de intubação se o governo tivesse seguidos os procedimentos recomendados, como isolamento social, uso de máscaras, informe publicitário correto etc.

Mandetta respondeu que se isso tivesse acontecido não estariamos vivenciando o descontrole dessa segunda onda da pandemia..

“A segunda onda que estamos passando é o ápice desse tipo de decisão tóxica, equivocada”, respondeu o ex-ministro da Saúde. Ele citou o personagem Zé Gotinha como um instrumento de educação, assim como “promoção em saúde” por campanhas com ídolos do futebol, por exemplo, para “unir” o país. “Teríamos tido uma segunda onda muito menor.” Para ele, “vacinando acima de 60 anos com duas doses, já teríamos quebrado o colapso do sistema hospitalar.”

A polêmica sobre publicidade federal é outro pronto crítico

Um dos temas centrais da CPI é a comunicação do governo durante a pandemia. E um dos focos da investigação será a contratação de influenciadores para difundir a cloroquina em suas redes sociais, além de omissões e falhas na política de comunicação que deveria transmitir mensagens em defesa de isolamento social e uso de máscaras.

De acordo com relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), dos R$ 83,6 milhões gastos em campanhas publicitárias para a pandemia, o governo federal gastou apenas R$ 800 milem ações para divulgar informações sobre o coronavírus, como prevenção, sintomas e medidas a serem adotadas em caso de suspeita de contágio.

Escrito por: Redação CUT